O Governo chinês
está a desenvolver um “sistema de crédito social”, que consiste num método de
classificar os cidadãos, num ranking, consoante os dados que eles fornecem a
empresas tecnológicas ligadas ao consumo e, com isso, garantir-lhes ou vedar-lhes
o acesso a determinados bens ou serviços. Parece um episódio do “Black Mirror”.
A disputa entre Rui
Rio e Santana Lopes pela liderança do PSD ficou marcada muito mais pelas
questões pessoais, tais como descobrir quem foi mais fiel ao partido e quem falou
menos vezes com o Pacheco Pereira, nos últimos quinze anos, do que pelas
políticas que cada um tinha para o país.
Tenho uma amiga que
diz que o vizinho do 5.º esquerdo faz voluntariado e é muito educado e
prestável (no fundo, uma jóia de pessoa), mas não gosta dele porque ele, uma
vez, chegou bêbado a casa, às cinco da manhã, e cantou o hino nacional, sem
erros, na escada do prédio, enquanto urinava num vaso.
O primeiro e o
segundo exemplos preocupam-me um pouco, mas o terceiro deixa-me aterrado. Quem nunca
cantou o hino bêbado? Assim se cria má vizinhança, sem necessidade nenhuma.
Todos estes exemplos
demonstram como a sociedade das redes sociais e dos “reality shows” está a
tornar as questões pessoais o centro de tudo. Qualquer dia, a sociedade vai empolgar-se com as eleições, que serão decididas, palmo a palmo, entre multas de estacionamento e número de palavrões ditos, nos últimos quatro anos.
Não demorará muito tempo até que uma selecção de um candidato a um posto de trabalho se faça da
seguinte forma.
- Chefe, temos aqui
este candidato. Doutorado em Engenharia Espacial.
- Eh pá, sim senhor.
- Dados retirados da
sua pulseira de actividade desportiva indicam que se deita sempre muito tarde e
que tem uma vida sexual muito activa.
- Eh pá, o gajo é um
javardo. Deve ser daqueles que vêm trabalhar cheios de sono.
- Tem mais dois
doutoramentos: um em Física Quântica e outro em Química.
- Eh pá, notável.
- Mas tem perfil no
Tinder e já pagou uma vez por sexo, na despedida de solteiro de um amigo.
- Eh pá, o gajo é um
libertino. Vai meter-se com as miúdas todas aqui na empresa. Isso dá mau
ambiente.
- Foi uma vez ao
espaço. Foi medalhado em natação, nos últimos Jogos Olímpicos.
- Eh pá, sim senhor,
um homem de acção.
- Teve seis multas
de estacionamento nos últimos dez anos.
- Ui, o homem
qualquer dia fica sem carta. Não queremos isso, depois chega sempre tarde ao
trabalho.
- Tem oito patentes
registadas, na área da robótica.
- Eh pá, um
inventor!
- Gosta da saga “Velocidade
Furiosa”.
- Ui, isso é
azeiteiro. Depois vai pôr aqui a música alta.
- Deu aulas no M. I.
T., durante dois anos.
- Eh pá, um
professor.
- Nas últimas
presidenciais, votou num candidato de esquerda.
- Eh pá, um
revolucionário, ainda nos faz aqui uma greve.
- Faz voluntariado.
- Eh pá, um homem
que percebe o seu papel na sociedade.
- Uma vez, chegou a
casa bêbado e cantou o hino nas escadas do prédio, enquanto urinava num vaso.
- De facto, este
gajo é muito qualificado. Mas a conduta deixa a desejar. Não tens mais ninguém?
- Tenho esta
candidata, doutorada em…
- O que pensa ela
dos direitos das mulheres?
- Uma vez, publicou
nas redes sociais que o sexismo era um dos entraves ao desenvolvimento da
sociedade.
- Esquece, é
feminista. Vai engravidar mal a contratemos.
- Mas tem seis
doutoramentos e os seus métodos ajudaram a recuperar uma empresa que estava perto da falência. Devíamos considerar…
- Esquece. Tens mais
alguém?
- Tenho este gajo. Licenciatura em Engenharia Informática por concluir, só trabalhou seis meses, nos últimos cinco
anos, porque rejeitou todas as propostas de trabalho. Mas diz a pulseira dele
que nunca se deitou depois das 23h.
- Liga-lhe.